Uma saudade: Eu chovo,tu choves ele Chove...
Processo: “Eu chovo, tu
choves, ele chove”
Sylvia Orthof
Penso que há a necessidade
de discutir o espaço que o teatro infantil tem na academia, tendo em vista que
é sempre abordado o teatro infantil de forma pedagógica e nunca como apreciação
teatral enquanto teatro.
Sylvia enfatiza que não devemos subestimar a inteligência das crianças, nem lhe
mostrar algo pronto, pois esta deve da maneira dela selecionar o que considera
interessante ou desinteressante tanto nas literaturas quanto em peças teatrais
direcionadas às crianças.
Atualmente, quando se trata de
montagens teatrais para crianças, utiliza-se em demasiado de textos
moralizantes e com final feliz, como no modelo da Disney, fato este questionado e totalmente avesso com a teoria
levantada pela Sylvia Orthof. Como escritora, Sylvia de “acriança” ao escrever,
mergulhando nesse imaginário infantil presente em todos, considerando seus
leitores capazes de entender aquilo que foge do óbvio. Há em suas literaturas a
quebra de uma posição hierárquica, utilizando de uma espontaneidade e
proximidade na escrita para as crianças, estreitando os laços com o público
alvo. Rejeita acomodação do leitor propondo mudanças com humor, aliás, está
presente em toda sua produção. Irreverente e criativa, Sylvia Orthof é a escritora
que por necessitar de liberdade, liberta o público infantil da obrigação de
ler. As crianças a lêem por prazer.
Como
encenadora, Sylvia quebrou tudo quanto é estereótipo na literatura infantil
brasileira, com o seu texto desobediente, esmerado, abusado, feito de riso,
provocação e arrepio. E o ator que trabalha com o
seu método, deve utilizar de brincadeiras para a montagem de sua encenação,
pois este deve sentir prazer em atuar tanto quanto a criança em assistir, e
este espetáculo deve ser “aprendizagem” e não moralista. De fato o teatro
infantil de Sylvia Orthof se vale do cômico e do ridículo para desmontar
estereótipos, questionar o mundo dos adultos, a autoridade constituída e as
instituições, inclusive a escola. Segundo Patrice Pavis:
O cômico não se limita ao gênero da comédia: é um
fenômeno que pode ser apreendido por vários ângulos e em diversos campos.
Fenômeno antropológico, responde ao instinto do jogo, ao gosto do homem pela
brincadeira e pelo riso, à sua capacidade de perceber aspectos insólitos e
ridículos da realidade física e social. Arma social, fornece ao irônico
condições para criticar seu meio, mascarar sua oposição por um traço
espirituoso ou de farsa grotesca. Gênero dramático, centra a ação em conflitos
e peripécias que demonstram a inventividade e o otimismo humanos perante a
adversidade. (PAVIS, 2007, p. 58).
Não se utiliza de uma estética
definida, visto que a criança é inconstante nos seus conceitos e aceitações,
suas histórias são feitas de misturas: um pouco de filme, livros e faz de
conta, sempre vislumbrando o imaginário e criativo das crianças, sem jamais
subestimá-las. Para o escritor e crítico da literatura infantil Celso Sisto,
Sylvia “Sabia dar cara nova às coisas gastas e velhas. Tinha plena
consciência de sua maneira especial de dirigir o olhar do leitor para a poesia
que brota das coisas mais simples e de encaminhá-la até os escondidos e escuros
da alma.” (SISTO, artigo site construir notícias)
Tratando de uma peça infantil nos conceitos da
Sylvia Orthof, a musicalidade do mundo imaginário das crianças está presente
constantemente do decorrer dos 50 minutos de encenação. Esta concepção musical
foi criada por todos, moldado de maneira que ficasse mais articulado e com
melodia interessante ao espectador, fizemos uso de cantigas e músicas
conhecidas de fácil compreensão e acesso deste público mirim.
Aproveitamos
o mundo faz de conta que Sylvia propõe, de maneira que os próprios atores fazem
parte deste universo em forma de criança, se apropriando dessas brincadeiras e
mostrando aos pequenos quanto é bom brincar. Buscamos mostrar que este universo
está dentro de cada um de nós, basta imaginarmos nossa própria história e
divertir-se ao máximo com isso. E baseado nesta proposta o elenco se prepara –
faz alongamento, aquecimento vocal, realiza a maquiagem – no próprio tablado de
apresentação, proporcionando que as crianças tenham conhecimento de todo
processo pré-apresentação. O principal foco desta preparação é a realização de
aquecimento vocal através de cantigas infantis, cirandas de roda e brincadeiras
que proporcionem este contato com o universo infantil, trazendo o ator e os
espectadores para o mundo das crianças.
O espaço de jogo é limpo, e a
cenografia vai surgindo ao longo da apresentação, apenas tem guarda-chuvas
suspensos sobre a área de atuação e uma mala fechada no fundo do tablado e dali
surgirão os personagens e toda a história criada por essas crianças e o público
mirim visualiza todo este processo de caracterização de personagem e efeitos
sonoros que esta peça proporciona.
Eu
chovo, tu choves, ele chove, teve premiação de melhor peça infantil, o que
incentivou Sylvia no investimento em escrever peças teatrais para o público
infantil. Neste estilo de linguagem utilizado, a escritora cria meios de maior
entendimento das crianças para os assuntos de aparentemente difícil
compreensão.
Este
processo de montagem foi uma experiência única e maravilhosa, pois trata
de assuntos e métodos diferenciados para os pequenos e resulta um enorme prazer
e ânimo trabalhar desta maneira. Pois
segundo Sylvia Orthof:
Escrever para criança é ser adulto-criança no momento mágico da escrita ou da leitura. A sintonia vira pipa, o fio que se avoa-inventa-tenta-volta-e-vem, busca de liberdade e céu. As asas-páginas devem bater dentro de nós, escritores e leitores. Não existem mais barreiras de idade, o mais infantil dos textos, quando bate na magia da arte, vira viagem! (ORTHOF, Sylvia. Blog)
Aprecio e respeito muito o
ensinamento e o aprendizado das crianças, pois estes são os responsáveis pelo
futuro da população, fato este que muitos da sociedade brasileira não levam em
consideração. A verdade é que estes jovens aprendizes são capazes de aprender
muito mais do que os adultos podem perceber, e muitas vezes não respeitam as
limitações e o momento correto dos fatos acontecerem.
Desta forma, concluo cada vez mais
que a montagem da encenação teatral infantil deve ser respeitada por todos, e
apreciada desde o processo inicial até a conclusão final de apresentação. Não é
por menos que Sylvia Orthof é considerada uma das maiores escritoras da
literatura e dramaturgia infantil, permanecendo nos dias atuais no topo de
apreciação dos que representam a história de teatro infanto-juvenil.
Referências bibliográficas
Biografia
Sylvia Orthof. Disponível em: < http://www.bmsr.com.br/autores/detalhe_autor.asp?cod=Sylvia%20ORTHOF
> . Acesso em: 25 set. 2011.
IORIO,
Maria Isabel. Sylvia Orthof. [blog
Sylvia Orthof]. Disponível em: < https://sites.google.com/site/sylviaorthof/biografia-da-autora
> . Acesso em: 25 set. 2011.
ORTHOF,
Sylvia. Livro aberto: confissões de
uma inventadeira de palco e escrita. São Paulo: Atual, 1996.
PAVIS,
Patrice. Dicionário de teatro. São
Paulo: Perspectiva, 2006.
SISTO,
Celso. Sylvia Orthof: o bom humor na
literatura infantil brasileira. [notícia construir notícias]. Disponível
em: < http://www.construirnoticias.com.br/asp/materia.asp?id=847 >.
Acesso em: 28 nov. 2011.
Teatro
Livro Aberto [blog teatro livro aberto]. Disponível em: < http://teatrolivroaberto.blogspot.com/
>. Acesso em: 25 set. 2011.
Wikipédia:
A Enciclopédia Livre [site de
pesquisa]. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%ADlvia_Orthof >.
Acesso em: 25 set. 2011.